quinta-feira, 26 de março de 2009

(H)erva (h)úmida

No livro Em redor de Africa. Narrativa succinta de factos verdadeiros e de impressoes colhidas em flagrante, ornada com trinta e quatro reproduccoes photographicas (Porto: Typographia da Empreza Litteraria e Typographica, 1915), da autoria do escritor português Eduardo de Noronha (1859-1948), encontramos deliciosa passagem, em que se descrevem as dificuldades de deslocamento na floresta (troncos, ramos, cactos), dificuldades mil que barravam...

"a entrada dos agressores hábeis em se arrastar, silenciosos como reptis, pela herva húmida ou pelas estevas resequidas."

As palavras "herva" e "húmido(a)" tendem a perder o "h" segundo o Novo Acordo. No Brasil, já escrevíamos "erva úmida", mas esta mudança é agressiva aos olhos, mais do que aos ouvidos portugueses. O "h" não altera em nada a pronúncia dessas duas palavras.

A discussão entra no campo da etimologia. Deixemos "erva" de lado por enquanto e nos concentremos no problema da "humidade".

O étimo mais correto é "umidus" ou "humidus"? Há registros de "humido" e "humydo" (século XIV), e de "humedo" (século XV), mas já a partir do século XVI encontram-se também textos com a palavra sem "h".

Na tradição de línguas que adotaram a variante latina com "h", conhecemos humid (inglês), humide (francês) e húmedo (espanhol). Mas a outra variante, sem "h", gerou umido (italiano), umed (romeno) e o nosso "úmido", no Brasil.

Se o Acordo pretende unificar a ortografia da língua portuguesa, a divergência entre o "húmido" de Portugal e o "úmido" brasileiro pedia uma solução. Não há divergências na maioria das palavras iniciadas com "h": "hoje", "hora", "homem", "humor"... Mas era preciso propor algo com relação à "(h)umidade".

A palavra em questão não é mencionada explicitamente pelo Acordo ("erva" é, e lá se estabelece a eliminação do "h" de "herva"). A Base II, dedicada à letra "h" inicial ou final, diz que o "h" será suprimido no início de palavras quando, "apesar da etimologia", esta supressão estiver inteiramente consagrada pelo uso.

Ora, no caso de "úmido", esta grafia está consagrada pelo uso... no Brasil. Mas também está consagrada pelo uso em Portugal a grafia "húmido". O Volp registra apenas "úmido", "umidade" e "umedecer". Talvez, na prática, os portugueses continuem com "húmido", "humidade" e "humedecer", alegando a favor dessa dupla grafia (e outras duplas grafias há) o mesmíssimo argumento da tradição.

Uma polêmica que não ocorreu, e lembra um pouco esta, é o uso do verbo "registrar" no Brasil, ao passo que em Portugal usa-se "registar". O Volp mantém as duas possibilidades, sem traumas. Voltaremos a esse tema um dia. Por ora, fica apenas o registo, ou o registro...

E é nessas horas que percebemos com mais clareza a necessidade de cumprirmos nova etapa na implantação do Acordo. A criação do Vocabulário Comum da Língua Portuguesa, com a participação de todos os países da comunidade lusófona.

8 comentários:

  1. Muito bom esse texto...

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  2. entendi nada... qual das duas formas é aceita no acordo ortografico atual? quer dizer, se cai uma questao num concurso publico, qual das duas estaria correta? ou seria de uso facultativo???

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  3. Realmente também fiquei sem saber ao certo qual utilizar humido ou umido?...como citou o amigo no post anterior, se cai em prova qual deverei usar?
    Fiquei na mesma....sem saber...

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  4. Não estou a ver ninguém a escrever húmido com h no Brasil e a gra ofia ser considerada correta.

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  5. Eu acho que nem ele percebeu nada do que escreveu...enfim!

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  6. Úmido no Brasil.
    Húmido em Portugal. Mas agora com o AO também pode ser úmido em Portugal. Dá confusão né?

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  7. Para que essa confusão toda? Cada país com sua grafia e pronúncia, como, aliás, acontece com os países que falam inglês... Theater e theatre, center e centre, etc, etc.

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  8. Bom dia, acabei de procurar no VOLP e não achei Humidade, apenas Umidade.

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